A Bela e a Fera - Jean Cocteau

La Belle et la Bete - 1946



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Jean Cocteau dá inicio a sua adaptação do clássico conto de fadas A Bela e a Fera com o costumeiro "Era uma vez...", mas, antes que a história comece, há algumas condições: "Crianças acreditam no que contamos a elas. Elas tem total fé em nós. Eu peço a vocês um pouco desta crença infantil." Através deste pedido, e desta obra, Cocteau nos induz a um estado que fica entre a vida adulta e a infantil e que nos faz sentir que a magia existe e que o amor é a cura para todos os problemas.
Confesso que sou absolutamente apaixonada por filmes antigos. É neste nicho que podemos encontrar tramas repletas de criatividade e poesia, alias, poesia era um dos maiores dons de Cocteau.

A trama é bem conhecida. Quando um mercador vai em busca de parte de sua fortuna (e que ele acreditava estar perdida por completo), na volta de sua viagem ele se perde na floresta, encontra um castelo e, em meio a noite e a tempestade, lá busca abrigo. Nós o seguimos para dentro de um reino encantado, que mostra beleza e ao mesmo tempo causa terror. 
Uma de minhas cenas favoritas no filme é a do corredor, que vai se iluminando aos poucos, por luminárias presas em mãos de braços que saem das paredes e que se movem. É absurdamente delicado e belo e, ainda assim, imaginem, braços incorpóreos, vivos...uau! 
As estátuas do castelo seguem o mercador com seus olhos, apenas, prestando atenção a tudo. Na mesa, um arranjo central formado por braços e mãos se desentrelaçam para servir vinho. É como estar em um sonho. 
O dono do castelo só aparece quando o mercador, já de saída, pega uma rosa do jardim (um presente que a filha mais jovem lhe pediu). A Fera, uma espécie de homem leão com roupas da época, pega o mercador no ato, condenando-o a morte. A Fera permite que o mercador volte para se despedir da família, mas em 3 dias deveria retornar para cumprir sua sentença, ou então uma de suas 3 filhas deveria tomar seu lugar. Bela, a filha que pediu a rosa, causadora de toda a situação, decide ir no lugar do pai, partindo as escondidas.



A jovem Bela é uma moça adorável, única realmente afeiçoada ao pai e que se veste como uma criada, cuidando da casa, das duas irmãs gananciosas e do irmão inútil. É cortejada pelo belo Avenant, mas Avenant é um homem estúpido, que menospreza a inteligência da moça, entre outras coisas. O curioso é que tanto Avenant quanto Fera são feitos por Jean MaraisA moça fica no castelo sozinha, apenas tendo a companhia de Fera durante o jantar, mas ele apenas fica lá, nas sombras. Mesmo assim ela é a Rainha do lugar. Tudo o que deseja surge em suas mãos, tudo o que quer ver o espelho mágico lhe mostra e aos poucos ela passa a ansiar pela companhia de seu anfitrião. 
Nunca chegamos a saber porque Fera foi enfeitiçado e nem por quem; não sabemos o porquê do lugar com suas estátuas que espiam, portas que falam, braços e mãos incorpóreos, etc, mas realmente não importa. Sabemos que ela está lá e que a mágica existe e ponto. Não precisamos de mais nada!



As tentativas de Fera de conquistar Bela não dão certo, afinal, apesar de usar belas roupas ele é um animal, que tem impulsos animais, que é visto caçando em quatro patas e sujo com o sangue de suas vítimas. Apesar de ele parecer ter bom coração, Fera não consegue controlar direito seus instintos animais, o que mantém a moça afastada, além disso, ela ainda é uma prisioneira. Claro, Fera acaba por permitir que Bela volte a casa da família, mas a avisa de que se ela não retornasse de boa vontade, ele morreria com o coração partido.
O irmão de Bela e Avenant, após verem as riquezas da moça, e após saberem das irmãs dela o que há no castelo, decidem ir até lá, matar a Fera e roubar tudo, inclusive o templo de Diana, onde Fera guardava seu mais precioso tesouro. 



É exatamente no templo que Cocteau nos mostra que Avenant, apesar da beleza externa, é tão feio quanto Fera por dentro e Fera, por dentro é tão belo quanto o exterior de Avenant. Quando Bela quebra a maldição através de seu amor, Cocteau nos presenteia com uma linda sequencia envolvendo Avenant e Fera



Cocteau desejava transformar a Fera em alguém tão simpático, adorável, superior ao homem que, ao se transformar no príncipe encantado, Bela sofreria com isso. Bom, ele conseguiu. Após a transformação fiquei com uma sensação de perda. Eu sei que a maldição deveria ser quebrada, mas senti falta das formas daquela criatura maravilhosa. Me peguei desejando que ele voltasse a ser como antes, confesso.



O interessante neste filme é que as cenas mais marcantes não tem diálogos (eu simplesmente amo a decoração do lugar, com suas mãos e braços que seguram luminárias e vão acendendo as luzes a medida que a pessoa passa ou as mãos e braços que se desentrelaçam no centro da mesa para servir vinho a quem esta sentado a mesa).
Eu resumi a história por não desejar tirar as surpresas, já que, mesmo mantendo as características do conto original, Cocteau deu seu toque e fez algumas mudanças no final. O que mais gostei: A quebra da maldição não pôs fim a magia.
Para quem gosta de filmes antigos, de arte, de belas e boas histórias, de magia, de contos de amor... não perca. Este filme vale cada segundo!



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